Marquês de Condorcet (1743-1794)

 

A Química do Amor

O amor é um fenómeno neurobiológico complexo, baseado em atividades cerebrais de confiança, crença, prazer e recompensa, atividades essas que envolvem um número elevado de mensageiros / atores químicos.

O amor é frequentemente celebrado como um fenómeno místico, muitas vezes espiritual, por vezes apenas físico, mas sempre como uma força capaz de determinar o nosso comportamento.

Sem querer discutir a magia do amor, vamos apenas abordar o amor do ponto de vista da química que lhe está associada: os compostos químicos que atuam sobre o nosso corpo – sobre o nosso cérebro, em particular – e nos transmitem todas as sensações e comportamentos que associamos ao amor.

Foi a antropologista Helen Fisher, famosa pelos seus estudos sobre a bioquímica do amor – e autora de vários livros, entre os quais o recente Porque Amamos: a natureza da química do amor romântico – que propôs a existência de três fases do amor, cada uma delas com as suas caraterísticas emocionais e os seus compostos químicos próprios.

A primeira fase é chamada ‘fase do desejo’ e é desencadeada pelas nossas hormonas sexuais, a testosterona nos homens e o estrogénio nas mulheres. É a circulação destas hormonas no nosso sangue – que se inicia na fase da adolescência – que torna o nosso cérebro interessado em parceiros sexuais, digamos assim. Ou, nas palavras de Helen Fisher “é o que nos leva a sair à procura de qualquer coisa”.

A segunda fase é a ‘fase da atração’, enamoramento ou paixão: é quando nos apaixonamos, ou seja, é a altura em que perdemos o apetite, não dormimos, não conseguimos concentrar-nos em nada que não seja o objeto da nossa paixão. É uma fase em que podem acontecer coisas surpreendentes, que por vezes dão origem a situações divertidas (para os outros) e embaraçosas (para o próprio): as mãos suam, a respiração falha, é difícil pensar com clareza, há ‘borboletas no estômago’... enfim... e isto tem a ver com outro conjunto de compostos químicos que afetam o nosso cérebro: a norepinefrina que nos excita (e acelera o bater do coração), a serotonina que nos descontrola, e a dopamina, que nos faz sentir felizes.

Curioso é verificar que todos estes compostos químicos – designados por neurotransmissores, já que participam nas transmissões do sistema nervoso e no cérebro – são controlados por um outro, chamado feniletilamina que está presente no chocolate. Estará aqui a razão para o chocolate ser uma prenda tão apreciada para os namorados, ou para ser tantas vezes a compensação para um amor não correspondido? Aparentemente, a feniletilamina é degradada rapidamente no sangue, pelo que não haverá possibilidade de atingir uma concentração elevada no cérebro por ingestão.

A feniletilamina controla a passagem da fase do desejo para a fase do amor e é um composto químico com um efeito poderoso sobre nós... tão poderoso, que pode tornar-se viciante. Os dependentes da feniletilamina – e dos seus auxiliares – tendem a saltar de romance em romance, abandonando cada parceiro logo que o cocktail químico inicial se desvanece. Quando permanecem casados, os viciados do amor são frequentemente infiéis, na busca de mais uma dose de excitação extra. Mas este tipo de viciados tem um problema: o nosso corpo desenvolve naturalmente a tolerância aos efeitos da feniletilamina e cada vez é necessário maior quantidade para provocar o mesmo efeito.

A terceira fase é a ‘fase de ligação’– passamos à fase do amor sóbrio, que ultrapassa a fase da atração/paixão e fornece os laços para que os parceiros permaneçam juntos. Há duas hormonas importantes nesta fase: a oxitocina e a vasopressina.

A oxitocina é também chamada a hormona do “carinho” ou do “abraço”.

A oxitocina é uma pequena proteína, com apenas nove aminoácidos, produzida numa zona cerebral que se chama hipotálamo. Esta proteína actua tanto em certas partes do corpo (como por exemplo na indução do trabalho de parto) quanto em regiões cerebrais cuja função está associada com emoções e comportamentos sociais.

 A vasopressina é atualmente conhecida como a hormona da felicidade. É também uma pequena proteína de nove aminoácidos (oito dos quais comuns à oxitocina) e o seu papel no corpo humano é vasto – o nome vasopressina, por exemplo, está claramente relacionado com a sua ação sobre a pressão sanguínea – e algumas experiências recentes com um tipo de roedor dos campos revelaram a sua importância no comportamento monogâmico dos machos.

A escolha de um parceiro é um processo que visa garantir a continuidade da espécie. Mesmo que nós não pensemos muito nisso, a verdade é que se as escolhas fossem sempre mal feitas, a espécie não teria sobrevivido. Por exemplo, as fêmeas tendem a procurar um macho que garanta o sustento dos filhos, enquanto os machos devem procurar fêmeas com boa capacidade de reprodução...

Mas há outros fatores envolvidos e um fator relevante parece ser o perfil genético: o parceiro escolhido deve ter os melhores genes possíveis, já que esses genes vão ser passados aos filhos. Nesta matéria assume um papel importante o chamado Complexo de Histocompatibilidade Principal, relacionado com as defesas imunitárias dos indivíduos. Aparentemente, todos nós procuramos naturalmente alguém com um sistema imunitário diferente do nosso, para conseguir que os filhos tenham o benefício de ambos os sistemas.

No fundo, quando nos sentimos atraídos por alguém, pode ser apenas porque gostamos dos genes dessa pessoa. Mas como é que nós avaliamos os genes dos possíveis parceiros? Este é um assunto ainda em discussão, mas no qual a química volta a assumir o papel principal!"

Paulo Ribeiro Claro e João Rocha, do Departamento de Química da Universidade de Aveiro


A familiaridade dos adolescentes atuais com a tecnologia

     A familiaridade dos adolescentes atuais com a tecnologia, que faz deles nativos digitais, não os torna automaticamente habilitados para compreender, distinguir e usar de modo eficiente o conhecimento disponível na internet. Pelo contrário, os dados sugerem que eles são, em grande parte, incapazes de compreender nuances ou ambiguidades em textos online, localizar materiais confiáveis em buscas de internet ou em conteúdo de e-mails e redes sociais, avaliar a credibilidade de fontes de informação ou mesmo distinguir fatos de opiniões.

As conclusões foram apresentadas pela OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), com base no relatório Leitores do Século 21 - Desenvolvendo Habilidades de Alfabetização em um Mundo Digital.

O relatório mostra as habilidades de interpretação de texto dos alunos de 15 anos avaliados no Pisa. Na média dos países da OCDE, esse índice era de 47%. O que mostra que, mesmo no grupo de países mais desenvolvidos, mais da metade dos estudantes de 15 anos não demonstrou, em média, capacidade de fazer distinção entre fato e opinião.

Segundo o estudo, apenas metade dos estudantes em países da OCDE disseram ser ensinados na escola para reconhecer se a informação que estão lendo é enviesada, e 40% dos alunos nesses países foram incapazes de reconhecer os perigos de se clicar em links de e-mails de phishing, por exemplo. As habilidades de navegação foram consideradas altamente eficientes para apenas 24% dos estudantes na média da OCDE.

As consequências disso são profundas para a inserção no mundo do trabalho e para o exercício da cidadania, uma vez que pessoas que não sejam capazes de compreender textos plenamente estarão, em teoria, menos aptas para ocupar empregos de alta complexidade e, ao mesmo tempo, serão presas mais fáceis para o ambiente de desinformação que floresce na internet e nas redes sociais. "Ter nascido na era digital e ser um nativo digital não significa que você vai ter habilidades digitais para usar a tecnologia de modo eficaz", afirmou no seminário Andreas Schleicher, diretor de educação da OCDE.

Os resultados também mostram que, apesar de sua crescente familiaridade com a tecnologia, os jovens não necessariamente aprendem instintivamente as habilidades necessárias para usar essa tecnologia para obter informações confiáveis.

De modo geral, o maior acesso a tecnologia entre os jovens nos últimos anos não se traduziu em mais educação mediática, disse Schleicher: os índices de alfabetização digital dos jovens evoluíram pouco nas avaliações do Pisa feitas entre 2000 e 2018, apesar das enormes mudanças sociais e digitais vividas pela comunidade global nesse intervalo de tempo.

Mais do que contato constante com a tecnologia, Schleicher defendeu que são a "aprendizagem tradicional" e o engajamento de professores que farão a diferença em dar aos alunos a capacidade de entender diferentes perspectivas em um texto e serem capazes de identificar nuances e opiniões.

O relatório mostra que, em sistemas educacionais nos quais essas habilidades digitais são ativamente ensinadas, estudantes pareceram mais capazes de distinguir fatos de opiniões. Mas Schleicher destacou que é um problema que ultrapassa os muros da escola e exaltou o trabalho de países que já têm uma cultura mais enraizada de leitura e alfabetização, como Dinamarca, Finlândia, Estônia e Japão.

O que se sabe é que o educador tem um papel central nisso, à medida que mudam as habilidades exigidas dos estudantes: no século 20, esperava-se que um aluno obtivesse conhecimento de fontes pré-curadas, como enciclopédias. Hoje, ele precisa aprender a distinguir o que é relevante entre milhares de resultados de uma busca no Google; precisa ser capaz de construir conhecimento e validá-lo, opina a OCDE.

"Os educadores precisarão ser grandes mentores, mobilizadores e guias" nesse processo, afirmou Schleicher.                                                                                   OCDE

Os perigos das mídias sociais e do vício em jogos electrónicos

Não é segredo que a maioria das plataformas e aplicativos de mídia social foram intencionalmente projetados para prender a atenção dos usuários o máximo de tempo possível. O objetivo dessas ferramentas é, entre outras coisas, explorar elementos como o preconceito e as vulnerabilidades psicológicas típicas da juventude.

Muitas delas estão intrinsecamente relacionadas ao desejo de auto-afirmação e, quase sempre, ao medo de rejeição. Por isso, o uso muito passivo dos aplicativos de mídias sociais — navegação pelas postagens alheias — geralmente está relacionado a sentimentos negativos como inveja, rancor e insatisfação com a vida. 

Há uma clara relação entre o uso excessivo de redes sociais, jogos violentos e aplicativos de filmes e séries com o surgimento de sintomas de depressão, ansiedade patológica, isolamento social e privação de sono. Na juventude, o excesso de tecnologia faz com que o indivíduo passe a maior parte do tempo interagindo virtualmente, o que afeta o desenvolvimento e faz perder outras experiências sociais importantes.

Nesse universo virtual, há, ainda, outra problemática que não pode ser desconsiderada: a forma como as mídias sociais dominam a mente e influenciam o comportamento de adolescentes e jovens. Como esse grupo ainda está em fase de desenvolvimento, a menor capacidade crítica aumenta a vulnerabilidade a essas influências. Por conseguinte, muitos jovens acabam substituindo a vida social pela vida online com muita naturalidade. Para eles, isso é algo comum, já que cresceram na era Hi-tech. Igualmente preocupante é o vício em jogos eletrônicos, problema que afeta consideravelmente a vida de muitos jovens internautas. 

A situação é tão preocupante que, no ano passado, a Organização Mundial de Saúde (OMS) incluiu o vício em jogos eletrônicos na classificação das doenças mentais. Além disso, o problema foi comparado aos casos de dependência química, já que as consequências mentais e físicas são bem semelhantes aos efeitos que as drogas ilícitas causam no organismo de um jovem.

gaming disorder, que em português significa vício em jogos, é uma doença que provoca a falta de controle que leva a perda de liberdade, já que o indivíduo não joga apenas porque quer, mas por que ele se sente coagido a jogar. Ainda que ele tenha consciência das consequências ruins que isso causa à vida familiar, pessoal, escolar, social e profissional

Listamos algumas das consequências mais prejudiciais à saúde relacionadas ao excesso do uso de tecnologia na vida dos adolescentes e jovens.

Aumento da solidão

A felicidade momentânea desencadeada por um ‘like’ pode aliviar temporariamente os sentimentos de solidão. Entretanto, esse tipo de “aprovação virtual” nem sempre supre os anseios mais profundos e, com isso, acaba aumentando a solidão e os sentimentos de frustração e angústia.

Ainda que pareça satisfatória, essa interação virtual não pode substituir a socialização por completo. A maioria dos adolescentes e jovens que se sentem “offline” em relação à vida se valem das mídias sociais para tentar neutralizar a dor e compensar o vazio emocional ou habilidades sociais menos desenvolvidas. Porém, essa vertente comportamental acaba gerando um ciclo vicioso, visto que pode exacerbar a solidão e resultar em graves prejuízos à saúde mental.

Exposição ao cyberbullying

As inseguranças resultantes das questões emocionais são facilmente percebidas pelos colegas durante a interação nas mídias sociais. Por conseguinte, os mal intencionados podem, apenas por diversão, disseminar palavras, emojis e imagens violentas ou até mesmo ofensas para humilhar quem está do outro lado da tela.

Esse tipo de “violência digital” direcionado às vítimas de cyberbullying influencia bastante o estado psicológico do jovem mais vulnerável. Na juventude, a sensibilidade e as emoções estão à flor da pele, o que aumenta a probabilidade de se sentir ofendido com mais facilidade. Nos casos mais extremos, esses ataques recorrentes de cyberbullying podem até mesmo levar à automutilação ou à decisão pelo suicídio.

Redução da autoestima

Os jovens mais habituados à interação virtual tendem a desenvolver maior insegurança em relação à aparência física, principalmente quanto à visão do próprio corpo. Essa questão torna-se ainda mais complexa devido à associação com distúrbios alimentares. A baixa autoestima e os sentimentos negativos contribuem para o surgimento de alguns distúrbios como a  bulimia, condição que pode resultar em graves danos ao organismo.

Sentimentos de depressão

Amplamente divulgado pela mídia, um estudo feito com 10 mil jovens canadianos com idade entre 12 e 14 anos revelou que quem passa mais de cinco horas por dia em redes sociais tem mais de 50% de chance de sofrer de depressão.

Para os jovens, a constante exposição às imagens que sugerem vidas perfeitas — ou rostos com aquela beleza fenomenal — já é suficiente para reduzir a autoestima e levar ao sentimento de inferioridade. Ainda que a maioria das postagens sejam apenas ostentação e cada detalhe das fotos elaborado no photoshop, a falta de maturidade emocional contribui para uma credibilidade passiva e  para o aumento das crises depressivas.

 O impacto das séries e filmes no comportamento dos jovens

Um estudo publicado na Revista de Psiquiatria da UNIFESP destacou que, entre o ano de 2000 a 2016, o percentual de suicídio entre adolescentes aumentou 24%. Esses dados colocam o suicídio entre as principais causas de morte entre adolescentes no Brasil. O mesmo estudo confirma a relação do uso de tecnologia em excesso com a depressão e as idealizações suicidas.

Para analisar melhor o impacto das séries e filmes na saúde mental dos jovens brasileiros, um grupo de pesquisadores realizou um estudo envolvendo 21.062 adolescentes. O objetivo era entender as influências da série Reasons Why sobre o comportamento dos participantes.. Além do aumento dos casos de suicídio entre jovens no Brasil, o que motivou esse estudo foi a polémica gerada em torno da provável influência da série da Netflix sobre o crescimento do suicídio entre os jovens americanos.

Na avaliação feita junto dos adolescentes brasileiros e americanos com idade entre 12 e 19 anos, eles responderam um questionário sobre idealização suicida antes e após ter assistido a série 13 Reasons Why. Segundo os resultados, entre o grupo de entrevistados sem sintomas de depressão, 4,7% responderam que, após a série, pensaram mais em tirar a própria vida. No grupo com histórico de depressão e com tentativas anteriores de suicídio, o índice foi surpreendentemente maior: 21, 6% dos participantes tiveram mais pensamentos suicidas após os episódios de 13 Reasons Why. 

Nos Estados Unidos, um mês após a estreia da série da Netflix, um estudo concluiu que o seriado está relacionado com o crescimento de 28, 9% nas taxas de suicídios de jovens naquele país.

Muitos pais ficam bastante preocupados com o modo como a exposição à tecnologia pode comprometer o desenvolvimento dos filhos. Entretanto, a adolescência é uma etapa marcada por um desenvolvimento peculiar, e que pode resultar em mudanças bruscas de comportamento. Por isso, é preciso ter habilidade para lidar com certas situações e, conforme a necessidade, encaminhar o jovem para o tratamento mais adequado.

A depressão e a ideação suicida

A ideação suicida é caracterizada por comportamentos relacionamentos ao suicídio. Geralmente, o indivíduo com esse perfil costuma falar em suicídio com muita frequência. Além da fala, alguns consideram que a morte pode ser a única solução para os problemas que estão enfrentando e, por isso, são defensores dessa ideia.

No entanto, a depressão é um dos múltiplos fatores que influenciam negativamente o estado mental de um jovem ou adolescente. Quanto maior a exposição aos fatores de risco, mais determinantes serão os impactos na saúde mental desse grupo.  Nessas circunstâncias, é importante ter atenção aos sintomas que indicam depressão nos jovens. Os mais comuns são os pensamentos negativos, tristeza profunda, perda de interesse pela vida, propensão ao uso de drogas, aumento ou diminuição de apetite, irritabilidade, agressividade e isolamento social.

Segundo informações da Organização Mundial de Saúde (OMS), há alguns fatores com maior potencial de desenvolver a depressão na juventude. Entre eles os mais relevantes são o desejo de liberdade ou de maior autonomia, pressão familiar, questões de gênero e o uso desequilibrado de tecnologias.

A depressão é considerada um distúrbio de natureza psiquiátrica resultante de uma alteração cerebral que provoca mudanças de humor e irritabilidade no comportamento. Devido à associação da depressão com outros danos à saúde, ela é classificada como uma doença crônica e bastante complexa. Há uma relação muito próxima entre a depressão e o suicídio: segundo a OMS, a cada três segundos alguém atenta contra a própria vida, e a cada quarenta segundos, um suicídio é concretizado.

 A importância de buscar ajuda

Segundo uma pesquisa da Associação Pan Americana da Saúde (OPAS), 50% dos problemas relacionados à saúde mental iniciam em torno dos 14 anos de idade. Entre outras razões, a prevalência da depressão em indivíduos jovens resulta do fato de a doença não ser corretamente tratada.

Destacamos alguns sinais que indicam a necessidade de buscar ajuda profissional para conter os reflexos negativos da depressão sobre a qualidade de vida dos adolescentes e jovens:

frequentes alterações de humor: o jovem está de sentindo muito bem e, de repente, demonstra tristeza e raiva, aparentemente sem motivo algum;

expressão de tristeza ou de sofrimento intenso: hábito de ficar relembrando experiências ruins do passado e demonstrar muita tristeza por isso;

obsessão por problemas: a pessoa se apega aos problemas, por isso, não consegue visualizar uma solução para enfrentar o que a incomoda;

insinuações verbais: comportamento excessivamente depressivo e falta de expectativa quanto ao futuro;

consumo abusivo de álcool e de drogas ilícitas: a maioria dos suicidas são indivíduos que têm o hábito do uso abusivo de álcool, drogas e remédios;

isolamento social: evita o contato com familiares e amigos e se afasta por completo de atividades sociais. 

 Nos casos de depressão grave, a internação pode ser uma boa alternativa. Essa medida está reservada para as situações em que o paciente se encontra num nível muito avançado da doença. Um dos sintomas mais claros é a perda de sua capacidade de autodeterminação ou a dificuldade de resolver os problemas comuns do cotidiano. 

Outro sinal sugestivo de internação é quando o jovem perde o julgamento de valor e passa a ser uma ameaça para si mesmo e para quem integra o seu ciclo social. A maior preocupação associada a esse quadro de perturbação mental é o risco de evoluir para comportamentos suicidas ou até mesmo para a finalização do ato.

Por razões culturais, o suicídio ainda carrega um estigma negativo e que impede as pessoas de falar sobre o tema. Por isso, em nossa sociedade, muitos ainda ficam inseguros na hora de abordar assuntos relacionados ao suicídio.

Conclusão

Ainda que o uso de tecnologias represente benefícios, é preciso atenção e cuidados especiais para ajudar os jovens e adolescentes a superar os impactos negativos desse problema sobre a saúde mental e física.                                                                                                 (Estudo da OCDE, 2019)


O jogo da baleia azul e os jovens na atualidade

     O psiquiatra Daniel Sampaio, que se tem dedicado ao estudo de tudo o que envolve e rodeia a adolescência, sublinha que os jovens que aderem ao desafio do jogo, Baleia Azul, são, regra geral, problemáticos, isolados e, por isso, mais vulneráveis. Nestes casos, os pais devem tentar, antes de mais, perceber os motivos que os levaram a participar.

Daniel Sampaio afirma que é muito importante fazer perceber aos jovens que não devem publicar nas redes sociais, "estados de alma", comentários ou qualquer tipo de informação que possa levar os "curadores" do "jogo" a concluir que estão vulneráveis, visto que esse será o primeiro passo para que sejam "recrutados" para o desafio.

            O “desafio” procura jovens em risco que não estão bem consigo próprios. Na verdade, os jovens sem problemas familiares rejeitam facilmente este tipo de abordagens. Por outro lado, os jovens de temperamento depressivo estão em perigo e importa ter em conta a gestão do risco a que eles estão suscetíveis. É certo que os jovens avaliam o risco de forma diferente do adulto, eles próprios colocam-se em risco, pois neles há uma sedução do perigo e o jogo proporciona-lhes o aumento do risco, explorando a sua apetência para o desafio dos limites.

A automutilação é sempre um sinal de alarme e há que atuar junto dos que estão em risco. Os casos perigosos são os jovens deprimidos, isolados, com mau desempenho escolar, que abusam do álcool e da droga. São jovens vulneráveis propensos à imitação do gesto do outro, do grupo.

O jogo desenvolve-se através de mentores ou curadores que se escondem sob identidades falsas. Eles selecionam os mais vulneráveis, visto que são os que podem corresponder ao que eles pretendem.

João Vasco de Almeida, da revista Cargo, alerta para o facto de que quem tem o poder tem o dever de impor regras. Assim os pais e os filhos têm de entender e aceitar que há regras a cumprir e que são elas que sustentam as relações. O norte da europa e Alemanha produzem jogos, veiculados através do vcontact, VK, uma rede social semelhante ao Facebook, em que um dos jogos alemães, acaba apelando com mutilações em apartamentos, onde os jovens adquirem vaucher para se irem automutilar em grupo.

Estes jogos são um sistema de controlo humano e tocam um lado negro do humano, pois eles fazem vídeos que, na dark web, essas imagens e vídeos são vendidos a pessoas com prazer mórbido e pérfido. Funciona com base em «curadores», gestores de clientes, organizados em pirâmide, em que o que se transaciona são imagens e vídeos, quanto mais se angaria mais se ganha. Há vídeos motivacionais, verdadeiramente assustadores, nada inocentes, pois são jogos com base académica. Uma estratégia é telefonarem e obrigarem os jovens a levantarem-se às 4h 20m da manhã, o que interrompe o ciclo circadiano dos jovens, parando a primeira parte do sono, onde se descansa fisicamente e isso interrompe-se, o que os impede do descanso psicológico. Esta é uma hora padrão, convidando-os a ver filmes de terror num telemóvel.

Assim, os pais devem confiscar durante a noite os tablets e telemóveis ou acordarem a essa hora e verificarem se os filhos estão acordados.

            Para a psicóloga Margarida Corgo Vitor Cotovio, este tipo de jogos são um sistema de controlo humano que recorrem à imposição e à manipulação. Eles apostam na vulnerabilidade adolescente; na sua necessidade de sentir e viver ao ritmo acelerado da sociedade. Hoje, inundamos os jovens de estímulos, desenvolvendo neles comportamentos acelerados.

É necessário o procurar sentir das coisas, colmatar a vulnerabilidade acentuada da necessidade de sentir e viver. Os jovens têm os pensamentos inundados de estímulos, o que gera um registo viciante. Cada vez mais eles sentem menos. É preciso ajudá-los na gestão do perigo e do limite.

Estes jogos têm a capacidade de entrar em zonas de vulnerabilidade, uma vez que os jovens têm menos capacidade de elaborar o pensamento. É preciso aprender a tratar e a gerir a frustração, a gestão do limite e do perigo que, quando está exposta, é sedutora.

Os jovens têm cada vez menos capacidade de tolerar a frustração e desconhecem o limite até onde é que se pode ir ou onde não se pode ir. Os limites existem e têm de se cumprir. Sem regras entra-se numa zona caótica.

Os sentimentos de vazio criam espaços que levam à mobilização para o seu preenchimento. Com a redução do sentido critico o perigo aumenta. Os jovens passam muito tempo na net com pouco suporte da vida real e muito suporte e reforço da vida virtual. A aptidão deles para a procura pela pertença no grupo, associado a uma vida pouco gratificante, pode contagiar para a procura e entrega a alienações, o jogo.

Outro aspeto importante é que o sofrimento físico consegue aplacar o sofrimento emocional, porque conseguem gerir mais facilmente o sofrimento físico e não o sofrimento emocional e existencial, ou seja, aguentar o sofrimento físico pois não se consegue controlar o sofrimento emocional. 

A atração pelo risco ajuda a superar, a dar um salto para a frente e a fugir da dor emocional. Os comportamentos de evitamento e de medo dos jovens, como andar com mangas compridas obstinadamente, as mudanças de comportamentos e as alterações da relação com o corpo são sinais.

Os jovens têm dificuldade de processarem informação elaboradamente. É preciso partilhar a intimidade entre pais e filhos, treinar a nutrição emocional das pessoas. Hoje há muita informação desligada do conhecimento e da sabedoria. É necessário o sentir as coisas, ter uma habilidade sócio emocional. Não se pode exercitar só o pensamento lógico, tem que se praticar a autorregulação e estar a atento a comportamentos de irritamento.

Os jovens em risco não tiveram oportunidade de gerirem o que sentem e elaborar o sentir. É preciso partilhar as vivências emocionais, nada de competições matemáticas, mas competições mais empáticas. Ter espaço para sorrir e chorar. Os pais devem partilhar password´s e serem visto como ajudadores. Ajudar a crescer de uma forma saudável não é controlar nem proibir, mas fonte de segurança e proteção. É preciso criar pertenças a que os filhos fiquem envolvidos com os pais. 

Fórum da TSF, 4 de maio de 2017

A estupidificação digital

 É preciso mudar tudo. O ensino deve estimular a interação humana, a criatividade, a empatia, a experiência. A sua tarefa principal não pode ser debitar informação – essa está por todo o lado –, mas criar cidadãos que reflitam, que relacionem, que acrescentem, que idealizem, que se mexam. Tudo o que um ensino feito através de ecrãs não oferece.

Os números são inquietantes. Uma criança de 3 anos está cerca de três horas diárias em frente a um ecrã; aos 8 anos, está cinco horas; na adolescência, sete. Entre a infância e os 18 anos, os miúdos de hoje, pequenos “junkies” eletrónicos, passam o equivalente a 32 anos letivos em frente do ecrã. As contas são do neurocientista francês Michel Desmurget, que estuda o fenómeno há quase duas décadas e que põe as coisas de forma crua, mas clarividente: os ecrãs são uma “fábrica de cretinos digitais”. No livro que escreveu com este nome, explica as inúmeras razões pelas quais os nativos digitais – ou seja, as nossas crianças – serão os primeiros a ter um QI inferior ao dos pais, e documenta-o bem: apresenta 45 páginas de bibliografia em que cita centenas de estudos científicos que atestam porque esta tendência é preocupante. 

Se este livro foi lido em São Bento e no Ministério da Educação, terá sido depois posto de lado. É caso para dizer que valores mais altos se levantam. O Governo está apostado numa rápida digitalização da educação, que pode ter os resultados inversos ao que se propõe, que é melhorar o ensino. Este caminho vem dar seguimento a um processo que se acelerou, por força das circunstâncias, na pandemia, e que é estimulado agora pelo objetivo do aproveitamento das verbas do PRR, com uma forte componente obrigatória de digital.

É preciso separar as águas. Há, claro, uma parte deste percurso que faz sentido, como a entrega de computadores a alunos e professores, a instalação nas escolas de laboratórios de educação digital para robótica e multimédia e a distribuição de painéis interativos para sala de aula. Tudo isto permite um acesso a ferramentas de trabalho complementares, importantes no século XXI. O problema está em fazer do digital o principal recurso de ensino, com a prevista digitalização dos manuais escolares e dos testes de avaliação, o que inevitavelmente leva a que as crianças passem a estar ainda mais horas em frente a ecrãs do que aquelas que já passam fora da escola. Nesta semana, o tema impõe-se, porque as provas de aferição do 2º, 5º e 8º anos, sob protesto de pais e professores, começaram a decorrer digitalmente. Estamos a falar de crianças que fazem testes eletrónicos mal sabendo reconhecer as teclas. O Governo quer que, em 2025, todas as provas e exames nacionais sejam neste suporte. O que se ganha na redução da burocracia perde-se na apreciação efetiva. A questão essencial, quanto a mim, é um ponto de partida errado. Está longe de estar provado que uma desmaterialização integral dos recursos educativos traga vantagens inequívocas para as crianças no longo prazo, e muitos estudos dizem precisamente o contrário. Um cérebro digital tende a ser mais disperso e impaciente e, por isso, tem mais dificuldade em acionar os circuitos de leitura profunda, que são fundamentais para a inferência, análise crítica e reflexão. Não é por acaso que muitos cérebros de Silicon Valley recusam dar tecnologia aos filhos pequenos. Como explica a neurociência, tudo o que não for usado e estimulado perde-se em anos críticos de formação. O resultado é já notório: as competências linguísticas e a capacidade de concentração estão a diminuir. Sim, estamos mesmo, como espécie, a ficar mais estúpidos.

Tudo isto acontece numa altura em que se vive uma revolução no mercado de trabalho, quando mentes brilhantes discutem os perigos da Inteligência Artificial (IA), que vem substituir funções até agora exclusivas dos humanos. Certo é que cada vez teremos mais máquinas a desempenhar mais tarefas diferentes – não se trata apenas dos trabalhos mecânicos ou repetitivos, mas de todos os que possam ser relacionáveis ou programáveis, inclusive através de machine learning. Sabe-se que 60% dos trabalhadores estão, hoje, em ocupações que não existiam em 1940, mas estima-se que a IA possa vir a substituir 300 milhões de empregos.

Neste mundo digital, as escolas têm de apostar naquilo que nos distingue verdadeiramente das máquinas. O saber escolástico e os métodos expositivos já não fazem sentido. É preciso mudar tudo. O ensino deve estimular a interação humana, a criatividade, a empatia, a experiência. A sua tarefa principal não pode ser debitar informação – essa está por todo o lado –, mas criar cidadãos que reflitam, que relacionem, que acrescentem, que idealizem, que se mexam. Tudo o que um ensino feito através de ecrãs não oferece. 

 P.S.: Há dois anos, partiu-se o tablet lá de casa, que era usado pela minha filha mais nova. Para seu desespero, optámos por não lhe dar outro. Hoje, com 9 anos, é ela a primeira a agradecer-nos: devora livros, pinta, pensa e está sempre a inventar coisas para fazer. Foi a melhor decisão educativa que tomei na vida.                                                                   Mafalda Anjos, Diretora Visão 18/05/23


Os Parasitas; o filme

 Quem são os verdadeiros parasitas do filme de Joon-ho? Os pobres que tentam sugar as vantagens e bem-estar do hospedeiro rico? Os ricos que parasitam os pobres através de um sistema capitalista injusto e opressivo?

No campo imensamente preenchido da sátira e crítica social, é difícil encontrar uma obra tão brilhante como “Parasitas”, que chegue como um furacão, vença todos os prémios principais da indústria cinematográfica e se torne um sucesso global, virando do avesso as nossas expetativas não apenas sobre cinema sul-coreano, mas também sobre tudo o que sabemos acerca da luta de classes.

A trama reduz-se essencialmente a uma família de origens humildes, que vive num casebre em condições degradantes num bairro de Seoul, e a maneira singular e audaciosa como conseguem infiltrar-se na casa de uma família rica, vestindo a pele de tutores (os filhos), motorista (o pai) e governanta (a mãe).

O tom cómico e satírico que o realizador Bong Joon-ho utiliza para expor os abismos sociais entre classes não deixa margem para dúvidas. O realizador quer que o tema do filme seja o mais óbvio possível e, por isso, ao longo de mais de duas horas, brinca com a realidade de uma família pobre que aspira à vida opulenta de uma família rica. Observamos as dinâmicas entre as duas famílias com um misto de admiração e horror, a torcer para que realidade não esmague esta fantasia tão bem delineada.

Nunca duvidamos que os pobres são mais inteligentes, menos ingénuos, mais endurecidos por privações na vida, mais aptos à adaptação e sobrevivência, e, se necessário, se mostrarão implacáveis para atingirem os seus objetivos. Mas há coisas que escapam ao seu controlo. Por mais que a família de vigaristas tente alcançar os seus sonhos, são traídos pelo “cheiro”. Não conseguem evitar. O “cheiro” da sua origem social está entranhado e não há sabão que o elimine, como o filme retrata magistralmente.

É uma mensagem cruel escondida no coração satírico de “Parasitas”. Até a casa onde decorre grande parte da ação é um reflexo dessa estratificação social. A bela casa onde decorre o enredo, construída por um famoso arquiteto, funde as suas linhas harmoniosas e graciosas com a natureza envolvente, um luxo reservado apenas para os ricos e muito ricos. Mas por trás da beleza da superfície, esconde-se um subterrâneo cheio de segredos, mais sujo e tenebroso, confirmando que o céu não pode existir sem o inferno, e vice-versa.

Em relação ao título “Parasitas”, muito se tem especulado sobre o seu significado. Quem são os verdadeiros parasitas do filme? Os pobres que encontram um hospedeiro rico ao qual tentam sugar todas as suas vantagens e bem-estar? Os ricos que parasitam os pobres através de um sistema capitalista injusto e opressivo? Ou poderá ser o próprio sistema social em pirâmide a ser considerado o parasita (o título original, em coreano, pode ser lido tanto no singular como plural) que, lentamente, destrói tudo e todos?

Uma coisa é certa. O sistema está cada vez mais concebido para impossibilitar qualquer triunfo, destruindo qualquer história positiva de superação pessoal e alargando o fosso das desigualdades. Os pobres estão condenados a transformar-se em fantasmas aprisionados nas profundezas subterrâneas, condenados ao escalão mais baixo, à espera de uma redenção que tarda em chegar. E, apesar do imenso humor que o realizador Bong Joon-ho utiliza para transmitir essa mensagem, no final, tira-nos o tapete e gela-nos o sangue.                                                                       Safaa Dib, Empresária 14 Fevereiro 2020