O jogo da baleia azul e os jovens na atualidade

     O psiquiatra Daniel Sampaio, que se tem dedicado ao estudo de tudo o que envolve e rodeia a adolescência, sublinha que os jovens que aderem ao desafio do jogo, Baleia Azul, são, regra geral, problemáticos, isolados e, por isso, mais vulneráveis. Nestes casos, os pais devem tentar, antes de mais, perceber os motivos que os levaram a participar.

Daniel Sampaio afirma que é muito importante fazer perceber aos jovens que não devem publicar nas redes sociais, "estados de alma", comentários ou qualquer tipo de informação que possa levar os "curadores" do "jogo" a concluir que estão vulneráveis, visto que esse será o primeiro passo para que sejam "recrutados" para o desafio.

            O “desafio” procura jovens em risco que não estão bem consigo próprios. Na verdade, os jovens sem problemas familiares rejeitam facilmente este tipo de abordagens. Por outro lado, os jovens de temperamento depressivo estão em perigo e importa ter em conta a gestão do risco a que eles estão suscetíveis. É certo que os jovens avaliam o risco de forma diferente do adulto, eles próprios colocam-se em risco, pois neles há uma sedução do perigo e o jogo proporciona-lhes o aumento do risco, explorando a sua apetência para o desafio dos limites.

A automutilação é sempre um sinal de alarme e há que atuar junto dos que estão em risco. Os casos perigosos são os jovens deprimidos, isolados, com mau desempenho escolar, que abusam do álcool e da droga. São jovens vulneráveis propensos à imitação do gesto do outro, do grupo.

O jogo desenvolve-se através de mentores ou curadores que se escondem sob identidades falsas. Eles selecionam os mais vulneráveis, visto que são os que podem corresponder ao que eles pretendem.

João Vasco de Almeida, da revista Cargo, alerta para o facto de que quem tem o poder tem o dever de impor regras. Assim os pais e os filhos têm de entender e aceitar que há regras a cumprir e que são elas que sustentam as relações. O norte da europa e Alemanha produzem jogos, veiculados através do vcontact, VK, uma rede social semelhante ao Facebook, em que um dos jogos alemães, acaba apelando com mutilações em apartamentos, onde os jovens adquirem vaucher para se irem automutilar em grupo.

Estes jogos são um sistema de controlo humano e tocam um lado negro do humano, pois eles fazem vídeos que, na dark web, essas imagens e vídeos são vendidos a pessoas com prazer mórbido e pérfido. Funciona com base em «curadores», gestores de clientes, organizados em pirâmide, em que o que se transaciona são imagens e vídeos, quanto mais se angaria mais se ganha. Há vídeos motivacionais, verdadeiramente assustadores, nada inocentes, pois são jogos com base académica. Uma estratégia é telefonarem e obrigarem os jovens a levantarem-se às 4h 20m da manhã, o que interrompe o ciclo circadiano dos jovens, parando a primeira parte do sono, onde se descansa fisicamente e isso interrompe-se, o que os impede do descanso psicológico. Esta é uma hora padrão, convidando-os a ver filmes de terror num telemóvel.

Assim, os pais devem confiscar durante a noite os tablets e telemóveis ou acordarem a essa hora e verificarem se os filhos estão acordados.

            Para a psicóloga Margarida Corgo Vitor Cotovio, este tipo de jogos são um sistema de controlo humano que recorrem à imposição e à manipulação. Eles apostam na vulnerabilidade adolescente; na sua necessidade de sentir e viver ao ritmo acelerado da sociedade. Hoje, inundamos os jovens de estímulos, desenvolvendo neles comportamentos acelerados.

É necessário o procurar sentir das coisas, colmatar a vulnerabilidade acentuada da necessidade de sentir e viver. Os jovens têm os pensamentos inundados de estímulos, o que gera um registo viciante. Cada vez mais eles sentem menos. É preciso ajudá-los na gestão do perigo e do limite.

Estes jogos têm a capacidade de entrar em zonas de vulnerabilidade, uma vez que os jovens têm menos capacidade de elaborar o pensamento. É preciso aprender a tratar e a gerir a frustração, a gestão do limite e do perigo que, quando está exposta, é sedutora.

Os jovens têm cada vez menos capacidade de tolerar a frustração e desconhecem o limite até onde é que se pode ir ou onde não se pode ir. Os limites existem e têm de se cumprir. Sem regras entra-se numa zona caótica.

Os sentimentos de vazio criam espaços que levam à mobilização para o seu preenchimento. Com a redução do sentido critico o perigo aumenta. Os jovens passam muito tempo na net com pouco suporte da vida real e muito suporte e reforço da vida virtual. A aptidão deles para a procura pela pertença no grupo, associado a uma vida pouco gratificante, pode contagiar para a procura e entrega a alienações, o jogo.

Outro aspeto importante é que o sofrimento físico consegue aplacar o sofrimento emocional, porque conseguem gerir mais facilmente o sofrimento físico e não o sofrimento emocional e existencial, ou seja, aguentar o sofrimento físico pois não se consegue controlar o sofrimento emocional. 

A atração pelo risco ajuda a superar, a dar um salto para a frente e a fugir da dor emocional. Os comportamentos de evitamento e de medo dos jovens, como andar com mangas compridas obstinadamente, as mudanças de comportamentos e as alterações da relação com o corpo são sinais.

Os jovens têm dificuldade de processarem informação elaboradamente. É preciso partilhar a intimidade entre pais e filhos, treinar a nutrição emocional das pessoas. Hoje há muita informação desligada do conhecimento e da sabedoria. É necessário o sentir as coisas, ter uma habilidade sócio emocional. Não se pode exercitar só o pensamento lógico, tem que se praticar a autorregulação e estar a atento a comportamentos de irritamento.

Os jovens em risco não tiveram oportunidade de gerirem o que sentem e elaborar o sentir. É preciso partilhar as vivências emocionais, nada de competições matemáticas, mas competições mais empáticas. Ter espaço para sorrir e chorar. Os pais devem partilhar password´s e serem visto como ajudadores. Ajudar a crescer de uma forma saudável não é controlar nem proibir, mas fonte de segurança e proteção. É preciso criar pertenças a que os filhos fiquem envolvidos com os pais. 

Fórum da TSF, 4 de maio de 2017

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